terça-feira, 13 de dezembro de 2016

As palavras que se recolhem



São as tuas palavras que se recolhem
no mais íntimo do meu pensar.
Foram escolhidas
para ter um lugar cativo.
São elas que guiam os meus dedos
por este labirinto de letras.
Posso tudo escrever mas são
o que disseste, o padrão
da multiplicidade de sentidos.
Posso escrever azul, porque o sinto
sempre azul, mas tu o disseste roxo.
Roxo será. Possa eu dizer cimo ou cume,
tu dirás encosta e eu não vou mais alto.
Porque o disseste. Isso tem um valor profundo.
Aquele valor que nos guia, cegos,
pelos caminhos da tua certeza.

Só, sou contigo. Um par de dois
em que um é também o outro.
Um par singelo. Um,
parto com dor.
Pudesse eu julgar-me
nos intervalos. Soubesse eu como se faz
o firmamento,
podia mostrar-te as cores
do fim do dia, onde só vês noite.
Não vês o antes.
Só o depois.

Tu aqui.
E eu também.
O dia teve um começo,
onde deste o primeiro passo,
para fora, de mim.
Palavra a palavra foste
erigindo o círculo onde te condenas.
Plantas cada sílaba,
nos cantos desse círculo
onde aparecem letras
desencontradas que vais deixando cair
uma a uma,
no teu percurso de gatas,
à procura?

Como fui eu ficar de fora?
O que fizeste afinal?
Sem mim não falas,
nada dizes,
apenas semeias vocábulos
sem fundamento.
Ficam soltos no ar.
De fora vejo-te no jogo
de apanhar letras e formar
termos compostos e disformes.
Estás a escolher de novo
as palavras para mas dizer
e eu guardar
noutro cantinho do meu ser.
Estou cheio de gavetas tuas,
onde guardo os teus sinais diários
de cada noite vencida.

Por estares, só me queres igual.
Por seres só, o que és,
me pensas aos poucos,
no parecer das sombras
nocturnas
de onde saem todos
os pesadelos.
Ofereces-mos.
Sou o guardador da tua intimidade.
Deste-te inteira ao meu regaço,
porque não duvidas
nem da minha existência,
nem do meu tormento.

Um dia, se mo deixares,
plantarei uma rosa no teu peito,
para que vejas crescer,
pétala a pétala
um ser diferente
e assim
aprenderes a amar.


LAM


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