terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Segredos de mel

O teu peito move-se adivinhado pelo lençol que te cobre os seios. Dormes. Um sono solto, seguro, improvável. O teu rosto denuncia a inocência dos teus dias de menina. Serena. A tua tez revela o teu ócio. Praia. Morena. Salgada e de cabelos amarelos. Naturais. Ao almoço, o teu sorriso branco, completo, contagiante, fazia-se ouvir por cima do prato de salada que partilhamos. Não tens passado, nem tens futuro. Toda tu estás no presente. É assim que decides viver. Intensa. Encontro-te vestida de nada com uma maçã na mão e os teus olhos pousados nos meus. Descalça. Permanecemos imóveis a tentar adivinhar o desejo do outro. O teu cheiro a mel invade os meus sentidos. Sorris, travessa. Sabes o que provocas. O que acontece. O que vai acontecer. É o nosso destino de crianças. Sempre foi assim. É assim que tem de ser. O tempo passou. É passado. O tempo que virá ao tempo pertence. Nada é mais que uma miragem sem sentido. Ambos sabemos isso. Resta-nos o que temos hoje. É sempre ao hoje que voltamos. Abraço-te. O teu odor a mel agora é meu também. O teu beijo é urgente no meu encontro, não menos urgente. Os teus seios que se moviam no lençol fazem agora parte de mim. Estão em mim. Tens o gesto quente. A tua língua solta. Os dentes. Procuramos o tempo. Todo o tempo em que não nos tivemos. Passado, presente e futuro estão agora aqui, em nós, de olhos fechados a ler no outro o que somos, o que temos. Estamos. O sorriso, as lágrimas e a dor do encontro fazem crescer o desejo. Não é um desejo qualquer. É um sonho adiado. A concretização desse tempo. Ofereces-me a maçã da tua boca que eu sorvo, satisfeito, os teus lábios amora. Num abraço vamos a pouco e pouco anunciando a pele e entre nós mais nada cabe na união perfeita das almas. Os dois num só. Momento. Presente. Pressente o dia-a-dia de cada vez que se renuncia. Procura. Encontro. Esse amor da entrega na entrega do amor. O calor dos corpos. O corpo a dois. Nada mais. Um suspiro uníssono e o abandono. As palavras que não são ditas. A noite nos ombros. O esboço num livro aberto. A vida. Despertos, resta o silêncio. Já tudo foi dito. Já tudo foi consentido. Por cima de nós, o tempo, porque nos consome, nos liquefaz no sono, para onde nos refugiamos. Já não precisamos partir. Todos os caminhos nos conduzem à chegada. Ao abraço prolongado nas mãos. Já nenhum desejo temos para cumprir. Saciados, nos quedamos completos. O teu peito sobressai no lençol, onde permaneces no repouso. Já não mais luta, já não mais dor, já não mais ansiedade nem angústia. Estamos completos. Nada mais nos resta sempre que encontramos as nossas bocas. Tu devolves-me em desejo o que eu te dou em serenidade. Uma troca feliz, quando tudo nos completa. Cheguei. Chegamos. Somos. Guardo a maçã na memória. O jogo que brincamos em segredo. Agora que me deito a teu lado e ouço o teu respirar sereno, já posso dormir. Eu guardo o teu sono, Tu devolves-me o sonho.

LAM

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