quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Carta sem destinatário




Trago nas mãos o universo e não sei o que fazer com ele. A flor do caos está cada dia mais bela.

São anos de verdades que se vão acumulando, construindo uma vida onde as certezas são cada vez mais certezas e temos pelo futuro apenas uma janela aberta. Umas vezes chove, outras, faz sol. Em suma, o bom tempo alterna com dias piores, mas é isso que nos faz ir avançando, mesmo quando as incertezas teimam em mostrar-se alegremente e dizer-nos que afinal, somos o que fazemos todos os dias.

Podia começar assim uma longa epístola onde tudo diria e nada podia ter de significado. Mas a verdade verdadeira, é que um olhar para o passado trouxe a angústia do que podia ter sido. Já nada podemos fazer quanto a isso. Acordamos todos os dias com a sensação que devíamos ter aproveitado melhor aquela ultima hora antes de adormecer.

As mãos. São o que melhor recordo. As mãos e os lábios trémulos num beijo proibido que se prolongou até que o tempo nos dissesse que bastava. O que podia ter sido, não foi. Naquele lugar, à beira rio, de noite, quando todos se espantam sentados em frente à lareira, nos dias frios, dois amantes, que não o eram, se seduziam no impossível, na troca de olhares e na certeza de dois rumos distintos. Um tinha a segurança. O outro, todas as dúvidas do mundo, que ainda carrega, nos dias que teimam em passar iguais. Sempre tão iguais.

As palavras que se calaram, foram as mais importantes. As coisas não ditas são as que melhor se guardam na memória. Uma recordação egoísta, pois só a um diz respeito. São um postal ilustrado, que se adquiriu num qualquer quiosque com o intuito de o enviar a um destinatário certo, mas que se guardou numa qualquer caixa, aquela onde cabem todos os momentos por viver.
Ninguém sabia o que seria real. Apenas o que estava errado era experimentado. E assim ficaram os dois na serenidade da conclusão de um, para o desgosto do outro.

Lembro o frio, não o frio de inverno, aquele que nos obriga ao encolher dos ombros para melhor se aquecer o corpo. Antes o frio na espinha, aquele que faz com que o coração se encolha no receio de que seja aquele o ultimo momento de uma vida. Uma vida inteira para viver, na incerteza, na angustia que amanhã já não tenha aquela voz, aquele sorriso, aquele beijo sereno, da convicção do futuro. Na calada da noite, tudo começou e acabou.

Agora, semeio rosas pelo caminho, na convicção de serem lembradas por quem passa.

Martin A. Sandwalker; NY August 1916

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